O que será do amor?
Passamos a vida toda aprendendo que amor e necessidade de estar com o outro representam a mesma coisa. A expressão mais fiel dessa crença é o fenômeno chamado paixão. Os românticos inveterados orgulhosamente dizem estar amando, quando na verdade, estão sofrendo por antecipação, fantasiando acerca de sua enamorada ou simplesmente vislumbrando belas pernas que trafegam à sua frente e moças com sorrisos angelicais que podem ser encontradas facilmente em qualquer shopping center ou balada da cidade.
Você me fala sobre o amor platônico, o que para o senso comum é, também uma paixão, coisa de momento. O grande engano é que o amor que atribuem a Platão diz respeito, verdadeiramente, a uma das mais belas formas de amor: o amor contemplativo. É o que você sente quando assiste a um nascer do sol depois de uma madrugada de conversa com um amigo, leitura ou bebedeira (não faz diferença). Você simplesmente aprecia aquele acontecimento da natureza. Não quer pegar o sol, as nuvens, os montes e guarda-los em uma caixinha. Você deixa que eles sigam seu rumo e quando oportuno, um novo encontro poderá acontecer.
Não que o amor seja algo totalmente distinto ou desconexo do sofrimento. Quem ama sofre, claro. A fórmula vendida pela mídia de amor eterno e duradouro é uma farsa. O amor faz doer, sangrar e criar expectativas por vezes ridículas. Ele também nos torna mais livres e tolerantes. Na última semana, vi um amigo compartilhar em sua página do Facebook que o critério único para que alguém faça parte de sua vida seria o motivo de você ser necessário, insubstituível para aquela pessoa. O pior é que, em maioria, pensamos assim. Buscamos sempre uma relação de causa-efeito para sustentar nossas relações. Tornamos menos importante e interessante o que oferecemos e ressaltamos sempre aquilo que pode ser a nós ofertado, o que o outro pode ou deve – como uma imposição nossa - fazer por nós. Aí está a armadinha!
Somos ensinados a atender as falsas necessidades que criamos dentro de um pressuposto compensatório. Imaginamos sempre sermos dignos de algo para além da realidade, para além do mundano e de toda a incerteza das relações. Procuramos algo quase que divino e inabalável. Algo menor que a perfeição pode parecer imoral e indigno do que chamamos de amor.
Na crônica “O amor bom é facinho”, Ivan Martins nos esclarece: “Acho que somos ensinados a subestimar quem gosta de nós. Se a garota na mesa ao lado sorri em nossa direção, começamos a reparar nos seus defeitos. Se a pessoa fosse realmente bacana não me daria bola assim de graça. Se ela não resiste aos meus escassos encantos é uma mulher fácil – e mulheres fáceis não valem nada, certo? O nome disso, damas e cavalheiros, é baixa auto-estima: não entro em clube que me queira como sócio. É engraçado, mas dói.”
Não damos brecha ao acaso. O acaso é inimigo. A própria distração habitual que a vida nos exige, ao não buscar em excesso, é inimigo. Estamos sempre por esperar algo grandioso, avassalador. Um divisor de águas em nossas vidas.
Talvez nosso maior aprendizado e desafio sejam de conseguirmos amar e deixar que nos amem de volta.
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